Cidadania, proteção e oportunidades. Essas são algumas das palavras que pensamos em se tratando do Dia da Visibilidade Trans, comemorado em todo Brasil neste 29 de janeiro. Em que pese as recentes conquistas, a data conscientiza sobre os percalços e vulnerabilidades que esta população ainda sofre em seu cotidiano.
Das vitórias, o destaque recai para o registro de pelo menos 9 mil estudantes transexuais que estão matriculados em escolas públicas e privadas. Esse número, ainda subestimado - já que depende do respeito ao nome social definido, reflete o movimento em construção de superação da segregação dessas pessoas ao ambiente educacional.
É de ciência, no entanto, que a evasão escolar é um empecilho e que muitos desses estudantes enfrentam barreiras como o bullying e a falta de trato e capacitação sobre diversidade de gênero de alguns educadores.
O quantitativo deriva do dossiê Registro Nacional de Mortes de Pessoas Trans no Brasil em 2024: da Expectativa de Morte a um Olhar para a Presença Viva de Estudantes Trans na Educação Básica Brasileira, da Rede Trans Brasil.
Todavia, é inevitável citar, com imenso temor, a manutenção, pelo décimo sexto ano consecutivo, do lastimável recorde brasileiro de assassinatos desta população frente a todos os outros países do mundo. Apesar da queda de 16% dos casos em relação ao ano anterior, o Brasil registrou 122 homicídios de pessoas trans em 2024, muitos desses em cenário de extrema violência.
Além de lidar com esses alarmantes dados de (in)segurança pública, divulgados em dossiê pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), o atendimento em saúde, especialmente na atenção psicossocial e no acompanhamento hormonal também são desafios postos. Observa-se avanços pontuais na ampliação da atenção especializada em endocrinologistas, bem como da assistência de psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais e terapeutas ocupacionais que ampliam suas capacitações em acolher cidadãos que enfrentam problemas de aceitação familiar e discriminações sistemáticas da sociedade.
Em Niterói (RJ), por exemplo, o ambulatório João W. Nery fornece, desde 2018, atendimento especializado para pessoas trans na Policlínica de Especialidades Sylvio Picanço, no Centro. O serviço foi o pioneiro entre as gestões municipais de todo o Rio de Janeiro.
Já no mercado de trabalho, as pessoas transexuais enfrentam dificuldades para conseguir vagas formais e promoções de cargo. A exclusão profissional e as dificuldades em qualificação acaba empurrando muitas pessoas trans para a informalidade e situações de vulnerabilidade social, agravando estigmas e perpetuando desigualdades estruturais.
Diante de um cenário preocupante, a representatividade política também é um empecilho. Com as últimas eleições municipais, dos 58.400 vereadores eleitos pelos brasileiros em 2024, apenas 28 são trans, de acordo com a já citada ANTRA. Neste campo, tratando novamente da preocupação social demonstrada por Niterói na temática, a vereadora Benny Briolly (PSOL) conseguiu ampliar seu número de eleitores para 4.801, um feito importante para a comunidade.
Em volta deste movimento, entidades e movimentos sociais do Brasil inteiro têm pressionado por políticas públicas mais efetivas contra a transfobia. Faz-se imperativo a criação de mais leis e programas sociais que garantam espaços para o acesso à educação, saúde e emprego. Neste sentido, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) do Governo Federal lançou na segunda-feira (27), em Brasília, a “Agenda de Enfrentamento à Violência contra as Pessoas LGBTQIA+”.
"[É necessário] interromper as dinâmicas de violência e de opressão. Quanto menos políticas públicas, mais retrocesso", assim registra a presidenta da ANTRA, Bruna Benevides, em matéria sobre o tema da Agência Brasil.
Bruna é uma dessas milhares de vozes que enaltecem a articulação entre sociedade civil e poder público para enfrentar o ciclo de violência e a chaga do preconceito que ainda persistem em ceifar e limitar a vida de tantas pessoas potentes, produtivas, inteligentes e belas.
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